Alguns clubes de futebol valem-se da língua como instrumento de afirmação identitária.
A torcida por determinada equipe esportiva frequentemente reflete valores culturais, históricos e até mesmo políticos.
Isso se faz notar tanto em alguns dos maiores clubes de futebol do mundo quanto em alguns dos mais tradicionais do Brasil.
Os espanhóis do Fútbol Club Barcelona são a principal manifestação de afirmação política da comunidade autônoma da Catalunha.
Uma maneira simples de constatar isso é observar a braçadeira de capitão da equipe, que, com suas listras amarelas e vermelhas, reproduz a bandeira catalã.
Também vale reparar nas palavras utilizadas para falar das cores do clube, o azul e o grená. O termo em catalão, blaugrana, é bem mais popular que o termo em espanhol, azulgranas.
Mas talvez nada seja mais significativo que o apelido Barça. Afinal, essa é uma palavra que utiliza o ç, e esta letra não se encontra no alfabeto da língua espanhola.
É por isso e muito mais que se diz que o Barcelona é més que un club (''mais que um clube''). Tudo é um lembrete de que, ali, está uma instituição a serviço do catalanismo.
O maior campeão nacional da Itália é a Juventus Football Club, de Turim. E o seu nome já é, por si só, um caso notável de afirmação linguística.
Assim como o espanhol não tem o ç, o italiano não tem o j. Logo, os bianconeri são praticamente uma anomalia ortográfica em seu país.
Ninguém que conheça Turim estranhará isso, no entanto. A cidade faz parte da região de Piemonte, e uma das línguas ali faladas é o piemontês.
E é nessa última língua que se escreve o nome Juventus e a sua forma simplificada Juve.
O 1. FC Köln — mais conhecido no Brasil como Colônia — tem entre seus apelidos Effzeh, numa referência às iniciais FC (isto é, Fußball-Club).
Embora outros clubes alemães também sejam ''FC'' (inclusive o Bayern de Munique), apenas o Colônia é conhecido dessa forma. Por quê?
A resposta está na forma com que essas duas letras são pronunciadas: diferentemente do alemão padrão, a ênfase do FC de 1. FC Köln recai no F, e não no C.
É assim que se fala em coloniano, um grupo de dialetos que se ouve principalmente em Colônia (cidade localizada no estado da Renânia do Norte-Vestefália).
A língua portuguesa apresenta uma norma bastante clara: qualquer palavra proparoxítona (isto é, aquela cuja sílaba tônica é a antepenúltima) deve ser acentuada.
Há diferenças entre o português europeu e o brasileiro em relação ao acento a ser utilizado. No Brasil, por exemplo, escreve-se cronômetro; em Portugal, cronómetro.
Daí também o porquê de um ex-técnico brasileiro se chamar Antônio Lopes e um técnico português se chamar António Oliveira.
De qualquer forma, o acento (seja ele o circunflexo ou o agudo) deve sempre estar lá.
Acontece que nem sempre foi assim.
Em fins do século XIX e início do XX, era comum os clubes brasileiros adotarem em seus nomes normas de grafia da língua inglesa.
Alguns inclusive mantiveram tais normas. O Fluminense, fundado em 1902, ainda tem como nome completo Fluminense Football Club.
Assim como o Grêmio, fundado em 1903, se chama Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense.
Outras instituições, ao longo dos anos, modificaram seus nomes em respeito às normas ortográficas.
Foi o caso do Club Athletico Paranaense. Fundado em 1914, o Furacão passou a ser Clube Atlético Paranaense a partir dos anos 1950.
Até que, recentemente, os seus dirigentes retomaram a grafia original. Assim, o clube se diferenciou do Atlético Mineiro e de outros tantos Atléticos ao redor do Brasil.
Ao fazer isso, talvez o Rubro-Negro do Paraná também tenha sido inspirado por outra instituição bastante tradicional: o America Football Club.
Fundado na capital fluminense em 1904, o Mecão continua fazendo questão de não incluir o acento agudo no e. E essa ausência só faz realçar a importância histórica do clube.
Podem até existir no país diversos clubes chamados América — vide o de Minas Gerais, o do Rio Grande do Norte e o do Ceará.
Mas America, sem acento, só existe um: o do Rio de Janeiro.
Clubes de futebol sempre oferecem aos seus adeptos uma forma de se identificar com algo que os distinga de outras pessoas.
Na maioria das vezes, são as conquistas dentro de campo que servem como uma forma de os torcedores de determinado clube dizerem ''somos os melhores''.
Mas também é útil ter à disposição uma ou mais palavras que permitam a esses torcedores dizerem ''nós somos diferentes''.
No fim das contas, é disso que se trata a identidade linguística de um clube — independentemente de estarmos falando de um nome, um apelido ou apenas uma sigla.
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